Está cada vez difícil de diferenciar artisticamente. A regra tem sido seguir as regras. Mas ainda tem aqueles que criam rotas alternativas para ir na contramão do que tem sido proposto. É o que faz Fernando Kep na mixtape “Vade-Mécum”. Até no formato, ele vai na contramão do que tem sido feito – sempre uma mescla de singles, vídeos e EPs. São quase 50 minutos, distribuídos em 16 tracks.
“No final de 2018 era um EP com 7 faixas prontas e gravadas, porém alguns outros corres da banca EndolaREC e do nosso coletivo Rap da Ponte fizeram com quem eu atrasasse os prazos e deixasse passar o “tempo das músicas”, algumas ideias já não eram as mesmas, eu já pensava de outra forma em alguns pontos, e simplesmente já não gostava mais de algumas músicas”, diz Kep. “Finalizando 2019, algumas outras músicas já haviam sido feitas. Passavam de 13 faixas livres. A partir disso, eu não enxerguei outra forma de lançar essas músicas se não fosse num compilado, mesmo sabendo o quão difícil é entregar uma obra extensa e densa num cenário prático e veloz repleto de outras urgências, enquanto artista independente e do interior”.
Mesmo com uma quantidade considerada exorbitante para os amantes da liquides musical, o LP não enjoa. Os versos de Kep, somados a sua voz rouca, a agressividade na interpretação, e a variação de instrumentais mantém os ouvidos atentos. Ele é autêntico. Conciso. Retrata com objetividade suas vivências nas ruas de Macaé (RJ).
“A escolha das músicas não foi difícil, pois venho mantendo uma linearidade em suas construções. Ainda que sejam esteticamente bem diferentes, procuro manter uma substancialidade que se faz presente em todas as minhas composições. Atrelado à isso, na mixtape confere-se uma montanha russa de sensações. Druk Beatz, Felipe Inki, Daniel DNA e BBKingSL foram imprescindíveis para que isso acontecesse. Na maioria das vezes eu recebi os beats e compûs, em outros eu participei da construção.No geral as letras foram construídas em cima deles. A importância que os beatmakers tiveram na mixtape é irrevogável e digna de orgulho”.
Fernando Kep considera essa mixtape “um livro de consultas em que a constante evolução requer uma constante devolutiva”. É aquele manual para recorrer nos momentos de crise, como o atual. O objetivo dele é estimular reflexões. “Abre alas pra uma nova percepção dos fatos: da autoanálise para autocrítica e da autocrítica para o conhecimento do outro. As rimas, na maioria das vezes, são ditas em primeira pessoa, porém a construção destas deve também às diversas interferências exteriores”, observa. “As músicas não são obstantes a nenhum conhecimento possível de ser mensurado, afinal cabe a cada um medir o que é relevante para si ou não”.
Apesar de todo o compartilhamento de ideias, visões e ideais, o MC diz que ainda não chegou ao “ponto alto artístico” [não que falte muito para chegar lá]. Por isso, rotulou seu projeto de mixtape, e não de álbum. “É uma forma de respeitar as limitações do projeto. Todas essas faixas foram gravadas na minha casa, e a maioria gravada por mim, não há um produtor musical pra manter uma linearidade sonora e técnica, os equipamentos são os mais simples e tudo é feito através do feeling. Enfim, diversos são os percalços que não permitem uma maior evolução do Vade-Mécum como um todo”.
“Vade-Mécum” tem sensibilidade. Transmite uma verdade, que atualmente não tem sido encontrada facilmente. Mostra o compromisso e a paixão que o artista tem por sua arte.
“Se procurar Vade Mécum no dicionário encontrará um significado simples; “livro de uso muito frequente, que o usuário costuma carregar consigo. Bom, Vade-mécum é uma expressão originária do latim que significa “vem comigo” ou “vamos juntos”, isto é, qualquer coisa que for importante levar consigo para consultar tarefas, ler lembretes ou até buscar referências. Normalmente são livros, apropriados para estudos especializados das áreas do direito, medicina ou até nos domínios da doutrina social da Igreja e de pensamentos políticos. Entretanto, olhemos por um olhar mais ampliado do seu significado, podendo ser um CD, um bloco de notas ou até uma pessoa em que se possa confiar o cargo. Por fim, apresento-lhe este resultado.”
Indicamos também: Rapadura no “Universo do Canto Falado”. Leia aqui.