milton ditou em notas
e meu pai em meu nascimento
descobri logo que
machado de assis tinha cor
assim como você e eu
e desde que xangô
com quatorze anos
em um sonho
pra mim apareceu
homens pretos me orientam
atribuem sentido à minha existência
eu os vejo
os escuto
os admiro
têm cores
curas
sabores
e circunferências diferentes
carecas, coloridos
ou corte do manguinho
puff, dread, power ou
como chamam americano
platinado vem final do ano
vale nevado
e nem precisou de helicóptero
como fazem os brancos
machado afiado
esculpem suas rimas
que, por sua vez, esculpem vidas
sentir um homem preto profundo
e eu nem falo de sexo
sua mente é que é o complexo
alguém foda por perto
em um ano caótico
sua visão me trouxe nexo
voz com tom tipo veludo
olhar que conduz no escuro
suas linhas servem como trilhas
e trilhos
você trem bala, por isto
no largo do machado aquele dia eu vi
mil homens pretos
lado a lado
assim como você quando rima
em muitos corpos
se vê multiplicado
na cidade das ruas estreitas
becos e vielas
seu nome é favela
o trem da vida
a conduzir que
podemos mudar nosso destino
próxima parada:
vamos de volta para casa
preto, pardo ou mulata.
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uma homenagem à esculpido a machado, álbum do leall que em 2021 foi lançado.