Dificilmente alguém vai discordar que Stefanie faz parte do panteão do rap nacional. É unanimidade. Como a própria diz nos versos de NÃO PIRAR: “Eu não sou novata nem vem querer vim me dar pito / Árbitra do meu jogo, então sou eu que apito / Aprendi que tudo é permissão, então não permito”. Essa autoridade não é imposta. Foi conquistada ao longo dos mais de 20 anos dedicados a arte das rimas. Sua escrita é diferenciada, instigante. Os desavisados se impressionam. Quem já a conhece sabe que sempre pode ter algum tipo de surpresa.
Mesmo com essa genialidade, só agora (2025), a MC de Santo André, no ABC Paulista, faz sua estreia solo com o álbum BUNMI. Alguém pode considerar que demorou. Não meu caso, pela qualidade, o desejo era que lançasse um a cada 365 dias. Mas sejamos realistas, o rap, e o mercado musical como um todo, não abre tantas possibilidades para mulheres negras.
Quando elas colocam facilmente os homens no bolso, o espaço diminui ainda mais. Porém, Stefanie se manteve. Esperou o momento certo para fazer algo que não vai ser esquecido facilidade.
Passe o tempo que for, ainda será relevante. Isso porque, ela não trata de questões utópicas. Compartilha suas verdades, trazendo à tona histórias que geram identificação e desconforto para quem se propõe a ouvir.
São intensos 38 minutos e 45 segundos, divididos em 10 músicas. As vivências e visões passadas ganham mais pulsão com as produções de Daniel Ganjamen e Grou. O boom bap faz parte da estrutura, mas não é o elemento principal. A variedade de texturas contribui para a fluidez. Também faz com que Stefanie apresente seu arsenal. Independente da cadência, ela é enfática, marcante.
POR UM FIO exemplifica essa facilidade de se adaptar a um tipo de formato. Neste caso, segue o mesmo direcionamento que Rodrigo Ogi para que a narrativa não fuja da tonalidade. O mesmo faz na FUGIR NÃO ADIANTA, a qual segue a suavidade de Mahmundi, porém noa deixa de ser intensa quando é necessário enfatizar alguns pontos.
“EU QUE VIM DA ÉPOCA DA CALÇA LARGA / NÃO LARGUEI MÃO E MINHA CANETA AINDA TEM CARGA”.
É umm caso de estudo? Talvez. Não podemos considerar que “BUNMI” se tornará algo descartável daqui algumas semanas. É um marco. Todo esse tempo de espera foi necessário. Stefanie prova que o rap (rap) permanece vivo. Que pode ser individual, mas é a coletividade que o deixa mais potente.
Ela reuniu Cris SNJ e Nega Gizza, duas grandonas das primeiras gerações do rap BR, com Iza Sabino, uma MC diferenciada da geração atual. Resgatou aquele Emicida que todos aguardam o retorno, criando um quinteto fantástico ao incluir KAMAU, Rashid e Rincon Sapiência. Trouxe Ana Tijoux e Jonathan Ferr. Este último faz uma fascinante camada de piano em MUNDO DUAL para que a rapper desabafe. Muitas coisas que precisamos assimilar e até visualizar. Para entender como, tem que escutar.