São Paulo. 22h30. O horário é ingrato para apreciar qualquer tipo de espetáculo, mas quase todas as mesas do Blue Note SP estão com seus lugares preenchidos. No palco da tradicional casa de jazz, o trompetista Joabe Reis esquenta a noite paulistana acompanhado por Sidimar Vieira (trompete), Josué Lopez (sax), Agenor de Lorenzi (teclados), Felipe Pizzutiello (baixo), Mackson Kennedy (guitarra) e Daniel Pinheiro (bateria).
Diferente dos 23 graus que fazem lá fora, naquele ambiente com a luz a meio tom, complementadas por velas, a temperatura sobe a cada tema apresentado. “Primeira Dose” abre a sessão. Porém, os arranjos originais são mantidos apenas na abertura e no fechamento. Ao longo dela, Joabe divide os improvisos com seus parceiros de trompete e sax tenor, que em alguns momentos impulsiona os solos com delays dos pedais.
Há um sincronismo perfeito entre toda a cozinha e os metais. Quase que continuamente acontece um diálogo sem que ninguém diga uma única palavra. Essa troca faz parte do DNA jazzístico, e ali segue-se a premissa, mas sem que exista uma regra pre definida. Cada um faz o seu para complementar o todo.
Depois da abertura efusiva, Reis fez versões de Black Focus, do baterista londrino Yussef Dayes, e o clássico Partido Alto, do percussionista Airto Moreira. As duas abriram o apetite para a entrada numa atmosfera ainda mais acalorada com a presença da carismática Ellen Oléria. Por quase 30 minutos, foram só “pedradas” de groove. Apesar de não ter a possibilidade de dançar, é impossível conter o corpo.
Enquanto a voz de Ellen ecoava, acompanhada pelo soul funk, as linhas de metais chegavam junto em períodos específicos para enfatizar as ideias. Ela não ficou por muito tempo no tablado, mas aproveitou cada segundo. Da forma mais fervorosa possível, manteve o público atento e o nível alto com interpretações ardentes de “Testando”, “Linhas de Nazca” e “Sábado Feira”
O baile seguiu com “I Just Wanna Breathe”. De surpresa, Joabe Reis mudou o percurso. Chamou o rapper Neto, do Síntese, que “apareceu sem avisar”, para fazer os versos em português e inglês. A inesperada colaboração deu liga. Aproveitando o gancho, outro MC foi convidado para soltar as rimas em “Aquidaban”, música inédita que estará presente no próximo álbum do trombonista, intitulado “028”. Esse projeto será uma homenagem à terra natal do artista, Cachoeiro do Itapemirim, em Vitória. Por esse motivo, cada tema representara um bairro da cidade.
Mesmo se esforçando ao máximo, SPVIC (Haikaiss) não conseguiu manter a cadência. Talvez ele não estava tão pronto quanto achava. Mas espera-se que no disco as expectativas sejam superadas. Nos minutos seguintes, Neto e SPVIC iniciaram um freestyle. Tornaram-se o ponto focal da performance, mas não cativaram os presentes – pode ser que em outro espaço essa “batalha” funcionasse melhor.
O ponto baixo não tirou a grandiosidade da apresentação. Os amantes da boa música, principalmente do jazz, precisam sentir esse calor de perto. Observando o caminho que Joabe vem sedimentando é possível afirmar que o próximo voo dele será internacional.