Fugir do óbvio já faz parte do conceito artístico do Hot e seu parceiro Oreia. Há uma singularidade em tudo que fazem. Isso fica evidente na personalidade, nas letras, nos shows e nos vídeos. Talvez, a ascensão deles tenha se iniciado após o bombástico videoclipe (+ de 6 milhões de visualizações) de “Eu Vou”, com o Djonga, que pega referências do filme “O Alto da Compadecida”.
Mais uma vez, a dupla mineira bebe na fonte do cinema brasileiro para criar um visual que une as músicas “Domingo” e “Presença”. O longa em questão é o celebrado (e às vezes odiado) Bacurau.
“Escolhemos Bacurau como pano de fundo, porque traz essa representação do que é ser brasileiro e como as figuras em cargos de poder não nos representam enquanto coletivo”, diz Hot. “Mostra uma visão nossa sobre como esses políticos de hoje são ainda tão coloniais quanto os que chegaram aqui há mais de 500 anos”.
No curta de quase 7 minutos, Dirigido por Belle de Melo e registrado em em Belo Horizonte (Minas Gerais) e Chapada (Minas Gerais), Hot e Oreia segue a estética do filme de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, mas não ficam presos a ele. Também possui elementos que fazem alusão a obras clássicas de artistas de Tarsila do Amaral (“Antropofagia”), Alfredo Volpi (“A Sereia”), Abdias do Nascimento (“Exu Black Power”) e Leonardo da Vinci (“A Última Ceia”). Mas não somente isso. Também reproduzem parte do discurso de Caetano Veloso no Festival Internacional da Canção em 1968: “é proibido proibir”.
“As releituras de filmes que fiz para os videoclipes do Hot e Oreia me permitiram desaguar a minha insatisfação sociopolítica frente ao cenário atual brasileiro”, diz Belle. “Domingo e Presença, que são músicas separadas, ficam unidas neste trabalho de uma forma muito singular e especial em uma narrativa que espero reverberar e provocar reflexões mesmo após o videoclipe terminar. É uma ficção sobre histórias muito reais: a nossa”.
Os dois sons fazem parte do álbum “Crianças Selvagens”. E o vídeo é uma crítica política e social, feita com o já conhecido humor ácido de Hot e Oreia, que também pretende “provocar uma reflexão sobre a diferença de classes e a supremacia branca que rolam no país”.