A pequena fila na porta da Audio, em São Paulo, já dava mostras do que iria encontrar na parte de dentro. O frio de sábado à tarde, 14, era apenas um detalhe para aqueles que estavam ali em busca de superar cada uma das etapas qualificatórias da FUJIFILM INSTAX Undisputed, uma das principais competições de break do mundo.
Pelos corredores, b-boys e b-girls de idades diversas se aqueciam, treinavam movimentos e até faziam disputas em algumas rodas. Nas quatro cyphers, no meio da pista, aconteciam as seleções sob os olhos atentos dos jurados. Para ir à fase seguinte era necessário pontuar em três critérios: físico, artístico e o interpretativo.
“Dentro desses critérios existem infinidades de subcritérios, tá ligado?, diz Mixa, um dos jurados brasileiros do Undisputed. “O físico é a técnica de como que o B-Boy ou a B-Girl executa os movimentos, como que ele dança, se ele dança na forma correta, na posição correta, se a estamina tá boa, se mantém do início ao fim, se ele faz os passos corretamente. O artístico é quem é a pessoa que tá dançando ali. É uma pessoa que tem uma certa individualidade, mas é destacada. Se ela tem uma personalidade mais forte, um jeito diferente de dançar, uma criatividade diferente dentro dos passos… e o interpretativo é como essa pessoa começa e termina dançando e qual é o clima que ela chega no round”.
A partir desses quesitos, alguns dos mais de 500 competidores e competidoras foram eliminados. Desses ficaram 48, que depois se afunilou em 16.

Com o alto nível, ficar no Top 16 não é algo fácil. Para chegar lá, o repertório faz toda a diferença. Esse é o caso do b-boy Leony, vencedor de 2024, que estava confiante no bi-campeonato. “A gente já vem com tudo pronto”, revela. “As nossas sessions já estão prontas… mas até rola um improviso na hora quando a música é legal, a gente conhece e sente o feeling do momento. Assim, de 100%, 90 % já é tudo planejado, é só tentar encaixar ali na música”.
Os responsáveis por soltarem as pedradas para fazer todos dançarem eram os DJs Nobunaga (Holanda), Batata Killa e MF (Brasil). As bases, em sua maioria instrumentais e versões remixadas de hits do rap, dava o toque. Alguns dançarinos comentaram que “hoje em dia não tocam mais os ‘rapão’(leia-se: répão) das antigas”. Isso não impede que a pista pegue fogo. A sintonia dos 3 DJs é sinistra. Um complementa o outro para manter o ritmo. Quando o som começa, os movimentos seguem as batidas. Os tênis tocam no chão amadeirado, fazendo sons característicos e deixando marcas brancas, como se fossem desenhos feitos por diferentes artistas.

Apesar das disputas serem acirradas, fora delas não existe rivalidade. O ambiente é divertido, animado. Rodas de dança se formam em qualquer espaço. “Isso ajuda também. O break tem essa coisa da coletividade, dessa união entre nós”, observa Leony. “Você vê aqui agora tá todo mundo conversando, trocando ideia, trocando energia, mas daqui a pouco todo mundo entra no modo competitivo. Isso fica lá dentro, porque a gente sabe que todo mundo tá no mesmo corre, tem a mesma dificuldade”. Defendendo o título, e um dos favoritos, o b-boy de Natal perdeu na semifinal para Kleyskin no solo masculino, que foi para final com Rato Evn, que venceu Matita.
Até parecia que MIXA estava prevendo o futuro. Antes de começar as finais, ele disse ter gostado das performances do Rato e do Kley. “Eu posso falar das pessoas que passaram no meu filtro, tá ligado? E aí foram os dois. Eles se destacaram pra caralho”. Depois de batalhas calorosas, Kleyskin sagrou-se campeão, garantindo vaga para o mundial em Tóquio. No feminino, a decisão foi internacional entre a mexicana Swami e a colombiana Celestia, que tinha superado a espanhola Madmax e garantiu o seu bi-campeonato na competição – também garantindo vaga no Japão, onde foi semifinalista no mundial. Na de Crew, outro favorito apontado por MIXA chegou na finalíssima. “Rock Ninjas e o Bairro Feliz fizeram um racha bom nas qualificatórias”, ressaltou. Porém, o grupo que levou foi o Vinotinto, da Venezuela. No júnior, um gringo também foi quem levou. Na disputa com Khalil, o estadunidense Kanato foi quem levou a melhor.

Essa participação de b-boys e b-girls de outros países, principalmente da América Latina fortalece ainda mais a modalidade no Brasil, que ainda não tem a valorização que merece.
“Os brasileiros são muito mais na raça de qualquer outra galera de fora, tá ligado mano?”, afirma MIXA. “Então, eu vejo que é importante, muito importante ter um incentivo. Isso traz uma troca com pessoas da Colômbia, Venezuela, Bélgica e México. Isso ajuda na construção das pessoas que estão participando. Por outro lado, é importante também que tivesse mais apoio durante o ano, nas épocas que não tem o Undisputed e o BC One. Com certeza, o nível do Brasil estaria bem mais alto. Esses eventos dão aquela animada, depois baixa a bola. A maioria das pessoas não vive do break porque é muito difícil, então tem que trampar, tem que fazer um corre enquanto vai dançar e tudo mais. E você vê que é um bagulho que exige muito treino, mano. É impossível você fazer as duas coisas em alto nível. São muito guerreiros e guerreiras”.
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