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Malía: “acho que eu encontrei o meu caminho. E o meu caminho é não ter um gênero musical específico”

Na entrevista, ela fala sobre o videoclipe de "Onda", feita em parceria com o Léo Santana, influências, musicalidade e, claro, Rihanna, sua maior referência.

Encontro Malía virtualmente às 18h15, de quinta-feira. Ela está toda montada no figurino. Parece que tinha acabado de sair do set de filmagem. O sorriso não sai do rosto. É energética até quando fala com seu gostoso sotaque. Por 20 minutos conversamos sobre o videoclipe de “Onda”, feita em parceria com o Léo Santana, influências, musicalidade e, claro, Rihanna, sua maior referência.

“Dentro desse universo artístico eu ainda não tinha apresentado para o mundo essa minha versão mais badgirl… que é o nickname da Rihanna”, diz ela. “É como as pessoas veem ela. Mas ela é só uma mulher que se respeita e consegue colocar no produto final dela aquilo que ela acredita enquanto filosofia. Ela é foda, e as pessoas tratam como se de fato ela fosse uma badgirl”.

Nesse vídeo, dirigido por Matheus Senra, Malía eleva o nível do seu trabalho artístico. Experimenta, mostrando um lado ainda desconhecido, e impressiona.

Gostei muito dessa brasilidade que vocês trouxeram em “Onda”… Me fala dessa conexão com Léo Santana e Mario Caldato.

 

Cara, então.. essa música foi escrita uns dois anos atrás num camping de composição. Então, só depois que eu fui atrás do Léo pra ver se rolava e ele super topou… e eu já tinha algumas guias, e, foi num desses processos de fazer essa guia, eu falei: “cara, vou mandar uma mensagem pro Léo pra ver se ele topa… será que ele topa fazer essa música?” Eu mandei pro Caldato com direcionamentos de como eu queria. E eu queria uma parada muito do que estava acontecendo no Brasil, sabe!? Ele dá o lance global pra música, e eu queria dar um contexto mais afunilado do que era o Brasil no momento. E aí eu mandei pro Léo a mesma guia que eu mandei pro Caldato, ele aceitou e a gente foi pra rua fazer. Eu queria que a música tivesse… (porque eu estou na incessante busca pela sonoridade… qual é a sonoridade da Malía?) E aí eu comecei a pensar nas coisas que compusessem minha música e denominei de “trapcal”, que é a mistura de alguns elementos de trap, principalmente a linguagem cada vez mais avançada, com instrumentos tropicais pra dar uma textura. O que eu mais amo na música é a textura. Eu gosto muito de instrumentos orgânicos que vão dar essa sensação de profundidade da música que vai fazer com que as pessoas tenham várias sensações enquanto escutam, sabe!? Tanto é que eu pedi muito para o Mário colocar a percussão, porque eu acho isso muito importante na hora da pressão, em como o grave vai bater… de como a música vai soar. Então, foi basicamente isso. Busquei misturar os gêneros, trazer um pouco do Léo… e o Léo também curte muito R&B. É uma coisa que ele já faz com uma outra coisa que ele gosta, e ao mesmo tempo acontece isso comigo.

 

Você falou em encontrar o seu estilo. Nos seus trabalhos tem muito R&B e nessa música ele se junta ao rap, trap e também ao pagodão baiano. Todas essas experimentações te ajudaram a encontrar um caminho definitivo ou não, a ideia não é ficar presa ao rótulo para encontrar a musicalidade ao longo do percurso?

 

Eu acho que eu encontrei o meu caminho. E o meu caminho é não ter um gênero musical específico. Eu até brinquei porque as pessoas quiseram que eu denominasse, então tá bom, vai ser “trapcal”. E isso vem acontecendo com as minhas influências brasileiras, que eu acho que de estrema importância, para além de trazer uma textura, ou uma sonoridade… eu gostaria de trazer uma identidade brasileiro pro meu som. Pra um som que vai ser pop… às vezes nenhum pouco pop, e é isso, entendeu!? Trazer uma coisa bem diferente pra o que vem acontecendo, principalmente no mainstream, porque a gente consegue acessar umas paradas muito diferentes no under (ground), mas no mainstream é difícil de chegar coisas diferentes lá… e eu quero fazer essa mistura chegar lá.

 

Hoje meio que todo mundo segue por um mesmo caminho. Se alguém lança algo de um jeito e estoura, vai todo mundo seguir aquele exemplo porque está dando certo. E trazer essa brasilidade acompanhada de elementos diferentes também é muito importante… o que você tem ouvido pra pegar referências e criar seus próprios sons?

 

O cara que eu mais ouvi na minha vida é o Djavan. E aí as músicas que eu mais ouvi por um bom tempo foi MPB. Hoje nem tanto, porque eu gosto de pesquisar. Então, eu me forcei a escutar várias coisas diferentes. Na época que eu morava com meus pais eu escutava muito dentro de casa e colocava os CDs que eu gostava de ouvir: Maria Rita, Elis Regina… Hoje, assim, eu tenho as referência da MPB e tenho as referências do trap que estou escutando muito: Tasha & Tracie, Cristal, Ebony, Onika… a Isa Sabino que lançou o álbum (Glória) dela agora. Eu estou escutando essa galera que tá chegando e tentando conectar cada vez mais com essas pessoas, porque, mano… elas já estão fazendo história, é uma linguagem muito foda, é o presente que já é o futuro. Então, eu quero estar perto disso. Eu tenho escutado e estudado muito.

 

Só gente pesada…

 

E graças a Deus eu to tendo acesso. To conseguindo ter conexão pra fazer uma parada foda assim…

 

O legal é que agora a sua parceria é com o Léo Santana, mas antes também foi com a Alcione e com o BK… Em todas elas, você não deixo a onda baixar. Conseguiu se adaptar facilmente.

 

Eu acho que todo mundo é um pouco assim, só que se assumir assim é difícil. Se assumir diferente é difícil, entendeu!? Ninguém gosta de ouvir só um tipo de música, todo mundo ouve várias coisas… e tá tudo bem também. Cada um tem sua forma de se mostrar para o mundo, e cada um entende a melhor maneira de fazer isso… só que eu me encontrei sendo várias coisas, me encontrei sendo um pouco de tudo. E acho que se eu perdesse isso, o meu trabalho não fazia tanto sentido quanto ele faz hoje. Eu acho que é por isso que eu consigo também chegar a esses espaços, porque ao mesmo tempo eu tenho tudo a ver com o Léo, eu não tenho nada a ver com ele. Isso é legal, porque abre novas possibilidades, fazendo com que a gente chegue em novos lugares. Eu sou muito curiosa, sempre quero chegar em algum lugar. Quando chegar nesse, tá bom, agora vamos para o próximo.

 

 

Também faz parte da nossa cultura brasileira que tem toda essa diversidade musical em cada canto. dentro dos próprios gêneros de trap está tendo diferentes variações, como no Rio que já começaram a misturar o trap com funk. Essas linguagem são bem legais, pois criam novas experiências. E eu vejo que você não tem medo de experimentar….

 

As vezes eu fico meio assim: “carai, eles vão querer me xingar… olha o que eu tô fazendo, mano”. Assim, não é trap, não é pop… e tem essa pressãozinha. Você precisa ser alguma coisa, mas NÃO. Sabe!? Eu gosto muito disso aqui gente, eu posso misturar sim. E aí eu vou trazendo minha legitimidade em cima disso, porque várias pessoas que não ouvem isso, vão ouvir. E vão ouvir de uma maneira diferente. Isso precisa chegar em todo mundo. precisa chegar em todo mundo.

 

Hoje com as plataformas de música digital, inevitavelmente o artista precisa ser inserido em alguma dessas caixinhas para entrar em playlists e ser encontrado pelo algoritimos. Por outro lado, não se rotular expande a entrega do seu trabalho para um público que não conhece. Em “Onda” você faz muito isso. O som é muito quente, tem uma vibe de verão, bem tropical, brasileiro. Como que foi fazer esse roteiro pra chegar no resultado final? Você deu alguns pitacos na direção de como queria que ficasse?

 

Assim, eu quis mil coisas… e aí a gente tá numa pandemia… aí que queria levar o Léo pra Cidade de Deus, mas não rolou. Então, falei: “tá bom, o que a gente vai fazer?”Aí eu dei a ideia de fazer quatro personagens, porque sou um pouco isso… ao mesmo tempo é e não é tudo aquilo tudo que eu apresentei. E eu queria muito trazer isso para o clipe. Também queria muito trazer a espontaneidade dos lugares que eu vou, tá ligado!? Porque a música é inspirada em algum lugar. Quando eu penso nela, penso no baile da Cidade de Deus, eu penso no rolê com a Dj Sophia em São Paulo… e para o clipe, eu também quis trazer essa ideia. Foi muito legal de gravar, o Léo é muito foda, foi uma energia muito maneira, foi especial, e a gente conseguiu traduzir muito o que a música dizia, sabe!? Todo mundo estava muito à vontade, e era isso que eu queria que tivesse. E não é somente sobre eu e o Léo. Queria que o clipe também fosse um pouco das pessoas. Queria que tivesse a verdade delas e que elas se sentissem à vontade pra fazer. Desde o começo pensei: “cara, esse vídeo fala sobre pessoas, e essas pessoas precisam se sentir representadas ali, donas e parte daquilo. Não serem somente figurantes.

 

Ele tem uma vibes bem Rihanna, principalmente nessa troca de personagens. Chega a ser uma declaração de amor pra ela?

 

Cara, tem algumas pessoas que são personas que você se conecta por ser um pouco parecidas com você em algum sentido. Não no sentido comparativo, mas na representação. E aí, mano, dentro desse universo artístico eu ainda não tinha apresentado para o mundo essa minha versão mais badgirl… que é o nickname da Rihanna. É como as pessoas veem ela. Mas ela é só uma mulher que se respeita e consegue colocar no produto final dela aquilo que ela acredita enquanto filosofia. Ela é foda, e as pessoas tratam como se de fato ela fosse uma badgirl. E eu acho isso incrível, porque também tenho isso muito em mim, porém isso só é mais visível pelas pessoas que conheço pessoalmente, do que para pessoas que estavam conseguindo acessar o meu trabalho… ainda não tinha mostrado esse meu lado. E aí, como faz isso? Eu consegui fazer isso de uma maneira muito natural, porque a Rihanna apareceu em vários momentos diferentes. Tipo, o raaampampampam-ram-pam-pam-pam (canta) foi uma coisa que eu fiz no estúdio durante a produção, porque alguma coisa me lembrou Rihanna. Sinceramente, não sabia que o clipe seria assim. E aí, calhou de ter um cabelo parecido com o que a Rihanna fez a capa da Vogue BR. Olha isso? Então, ela chega no clipe dessa forma: me abençoando com o recorte que ela tem do que é irado, do que ela traz pra gente.

 

É interessante que quando o clipe começa a gente já toma uma porrada. Na primeira vez que vi eu disse: MALÍA!! Ele vem numa linha totalmente diferente dos outros que são mais soft, mais rua… tem um visual mais urbano. Nesse aqui, você já tá montada numa estética bem diferente do que vinha apresentando.

 

Nossa… muito legal você parar pra pensar nisso, porque a gente pensa tanto pra chegar num resultado legal. E sabe o que acho mais incrível, agora falando do meu diretor ( )? Ele fez todos os clipes, e todos foi com uma linguagem muito diferente. Tipo assim, a gente nem precisou mudar de diretor, porque era uma preocupação minha de fazer um com determinada pessoa e outro com outra pra que a gente ter uma ideia pra ver que ia entender a Malía melhor, entregando produtos diferentes com texturas diferentes, visualmente falando… mas achei que ele conseguiu entregar muito bem e com um ar muito sofisticado, uma parada muito foda. Tô bem feliz de você ter reparado nisso, porque deu trabalho, e realmente a gente quer que as pessoas entendam as nuances, aonde a gente tá tendo trabalho pra fazer isso soar de uma maneira diferente. É importante esse reconhecimento.

 

Vocês trazem muitas referências, tem uma luz e todo um visual trabalhado que chama a atenção. E tudo se conecta com a letra. Essa você fez num camping de composição, mas dia a dia como funciona o seu processo de composição. Flui naturalmente ou é necessário ter um momento a sós para compor?

 

Geralmente flui naturalmente. Quando eu cheguei no camping, “Onda” já estava sendo composta. Aí me perguntaram: “Malía como é que são as gírias do Rio de Janeiro?” Tava em São Paulo… e a música era: “no rolê da minha quebrada eu colo maloca”. Eu disse: “gente, não”. Aí, colaborei com o refrão, que é muito Rio de janeiro… “fi, não corta minha onda”… “menor, não se envolve”… é isso, entendeu!? E aí, eu trouxe o meu Rio de Janeiro com uma ideia muito foda, um flowzinho muito sucinto que gostei muito. Esse foi um dos primeiro processos em conjunto que eu tive na minha vida. Mas to sempre compondo, porque acredito na prática. Pra mim é muito natural. Muitas vezes penso que tenho que escrever e só escrevo, sabe!? Mas nessa foi uma parada pensada com a intensão de fazer algo que encaixasse. E no final, eles naturalmente trouxeram o feat da música: o Léo Santana. Tô bem feliz, esse filho nasceu, numa gestação longa, mas nasceu.

 

 

É bem interessante isso, porque você traz uma identidade do Rio de Janeiro e o Léo com a de Salvador e tudo se conecta. Tem a mesma linguagem de quebrada, periferia. Cada um na sua realidade, mas ambos com algo em comum pra compartilhar.

 

É isso, em todo lugar existe uma favela e em todas as favelas se conectam. E eu to muito ansiosa pra ver as favelas do mundo se conectarem na música. Quando esse momento chegar… ahhhhh (sorri) eu acho que o bagulho vai pegar fogo, entendeu!? É sobre isso.

Quais são seus próximos passos em 2021?

 

Eu tô preparando um projeto, mas o que eu posso adiantar é que eu sou oficialmente a madrinha da primeira liga feminina de CS (Control Strike) do Brasil. Aí, eu escrevi uma música pra essa liga, que vai sair em breve e eu tô muito animada. Vai ser muito legal.

Que loco. E você joga…

 

Acho que jogar, todo mundo joga. Acho que só não posso dizer que eu sou gamer. Mas isso sempre fez parte do meu cotidiano. Meu pai e meu irmão sempre jogavam muito… eu tô amarradona, porque, caraca, é um projeto muito legal que a gente ainda vai conversar.

 

 

Indicamos também: Iza Sabino: “Glória veio pra testar a minha fé”. Leia aqui.

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