A trajetória musical de delanegra tem mais de 15 anos. Porém, depois de fazer parte de diversas bandas e produzir trilhas para o cinema, o músico, compositor e produtor decidiu começar sua própria viagem. O ponto de partida é o EP “FESTA DE PESCADOR É A TRISTEZA DO PEIXE”. A inspiração para criá-lo surgiu durante o período de isolamento no pico da pandemia de COVID-19. Apesar do caos, a experiência se tornou combustível para ele impulsionar a sua arte.
O estudo que fez sobre as mais diversas musicalidades, da diaspórica africana aos subgêneros do rock, também foi essencial para direcionar o caminho que devia seguir. Nesse experimento, delanegra conseguiu unir diferentes elementos de um eletrônico alternativo, mais denso. Essa textura, que vai da “rigidez” à leveza, reflete muito bem o momento sombrio, mas é amenizada por uma voz afetuosa e versos sensíveis que vislumbram a esperança, refletem sobre as boas lembranças – que por outro lado machucam por serem de um tempo que não voltará mais -, expõe também os medos, alegrias e as inseguranças da vida.
De forma metafórica, faz provocações. O foco de tudo está nas relações, algumas abaladas, outras afastadas e uma parcela perdida. A estrutura quase poética traz acalento. “a tristeza do peixe” sintetiza o “conceito”. Serve como um grito de libertação, mesmo para alguém que está preso em algo e tem expectativas de se libertar em algum momento. Ao mesmo tempo que amarra toda a narrativa musical iniciada com um causo de pescador – e avisa o que está por vir -, a música traz um afago àqueles que precisam.
Para desenvolver as ideias, o artista pegou referências do curta-metragem “O Peixe”(2016), de Jonathas de Andrade, que acompanha pescadores de uma vila no Nordeste do Brasil no ritual de abraçar os peixes depois que pescam. O abraço “é um rito de passagem – onde o homem retoma sua condição de espécie e, olho no olho diante de sua presa, a acalma através de uma ambígua sequência de gestos: afeto, violência e dominação”.
“Provocado por um amigo que me mostrou o filme, durante uma brincadeira cheguei na frase que dá nome ao EP: “FESTA DE PESCADOR É A TRISTEZA DO PEIXE”, entendendo que essa era a metáfora perfeita para o que estava vivendo, a dialética entre as alegrias e tristezas que enfrentamos na vida e como cada sujeito pode esporadicamente ocupar a posição e as responsabilidades de qualquer um dos personagens: o que pesca e o que é pescado, diz ele.
Em pouco mais de 10 minutos é possível observar todas essas analogias e compará-las com a realidade do Brasil. Talvez despretensiosamente (ou não), delanegra conseguiu sintetizar os sentimentos dúbios de uma sociedade machucada por adventos não programados, e outros previstos, porém, não levados em consideração. A única negativa deste trabalho é que ele acaba rápido. O que suaviza isso é a possibilidade futura de um álbum mais cheio.