Nada indicava que o domingo, 23, a chuva chegaria com tanta intensidade e acompanhada de uma ventania. Mesmo assim, o aniversário de 7 anos da Batalha do Cálice, na Concha Acústica do Taquaral, em Campinas, se manteve. Organizada por Ikki, Azec e Angel, essa é uma das principais batalhas do Interior de São Paulo, recebendo MC’s da Região de Campinas, Capital e Grande São Paulo.
Debaixo de uma chuva intermitente, que criava expectativa ao diminuir e tirava a brisa quando aumentava – a todo momento -, quem se propôs a estar presente, munido de guarda chuva, capa, guarda sol (onde fiquei acomodado, graças ao convite do Thiago San e a receptividade de Renata – ou sem nenhuma proteção, não se arrependeu do que presenciou. Confesso que no meio do caminho pensei em desistir por causa do temporal. Mas a curiosidade falou mais alto.
Cheguei um pouco antes do início das disputas, quando Da Lua finalizava o show principal. Antes dele, Dj Chakal, Yuri Odio e Mina Criis marcaram presença. Por conta da água que insistia em cair, a vontade de ir embora não saía da mente. Naquele vai e não vai, fiquei. Os confrontos se iniciaram perto das 16h30 com apresentação de Ikki e Bob 13, um dos fundadores da Batalha da Aldeia e Mestre de Cerimônias do reality “Nova Cena”, da Netflix. No júri estavam Franco, Kairós e Vale. O formato escolhido foi de trio. Punka, Wesk e NGO levaram o primeiro combate. O segundo foi vencido por Disom, Kriollo e Da Jovem. Guri, Killua e Ayron fecharam o terceiro. A quarta vaga ficou com Lil Vi, Levinsk e Ajota, e a última da fase classificatória foi garantida por Jhony, Thiago e Brennuz.

Apesar das condições climáticas só piorarem, com o passar das horas o público foi aumentando significativamente. Isso reflete na importância do Cálice no fomento da cultura hip hop dentro do seu território. “É Calice caraio, isso é 019”, dizia um dos gritos de guerra puxados antes dos MC’s começarem a batalhar, seguido por “vai matar ou vai morrer, vai morrer ou vai matar”. Essas frases eram repetidas com empolgação por adolescentes e jovens, em sua maioria, que não deixaram as intempéries do tempo atrapalhar o rolê. Da mesma forma,reagiam quando um verso golpeava forte.
Por volta de 19h, a chuva parou. Diferente do início, a arquibancada estava quase tomada. Todos atentos e na expectativa para o que viria. Pratas da casa Disom, Kriollo e Da Jovem foram eliminados na semifinal por Jhony, Thiago e Brennuz. Mesmo Azec dizendo “que não era sobre ganhar ou perder e sim sobre perspectiva”, o trio do interior foi melhor no desenrolar das ideias. Porém, não levaram.
Nos rounds das finais, a lírica caiu de qualidade, indo para um contexto sexual que aguçou a masculinidade frágil que atormenta o imaginário dos homens – do rap, mais ainda -, caiu para o lado da homofobia e gordofobia. Lil Vi levantou esses pontos na resposta que deu ao Thiago (nas disputas iniciais, a Punka já tinha abordado o assunto, que deve ser considerado porque tem sido recorrente). Mas quem salvou, batendo de frente com os estereótipos, inclusive se autodeclarando a “gordinha mais gostosa do Brasil”, para rebater uma rima que falava do seu corpo, foi a Levinski.
No 1 a 1 que definiria os 3 campeões, ela deixou o Johny sem argumentos. A vitória dela, ao lado de Lil Vi e Ajota, mostrou que é cada vez mais necessário a presença feminina nas competições. Dos 30 participantes, apenas 4 eram mulheres. Levinski levou o título e, ainda, foi a MVP. Kriollo também merecia levá-lo pela desenvoltura ao longo dessa Batalha do Cálice especial de 7 anos. Mas pela representatividade e ,principalmente, pelos golpes certeiros que deu, deixando seus “rivais” na lona, a Rainha do Twolala fez jus à conquista. Deu mais um (dos vários) sinal de alerta de que a presença delas é essencial nas folhinhas, organização e nos bastidores.
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