O termo “favela” se popularizou a partir do início do século XX ao denominar habitações populares no país, instaladas principalmente em morros, é originário de um tipo de árvore com espinhos, flores, frutos e sementes altamente nutritivas muito comum na caatinga e, especificamente, no Morro da Favela, em Canudos, no sertão da Bahia. Foi ali que se instalaram os soldados da Guerra de Canudos, convocados para combater os membros da comunidade liderada por Antônio Conselheiro, por causa da visão que tinham do vale.
Quando retornaram para o Rio de Janeiro, sem a assistência prometida pelo Governo, ocuparam o atual Morro da Providência, que passou a ser chamado de Morro da Favela. Parte da realidade de uma grande parcela dos brasileiro, essa representação urbana formada na sua maioria por barracos de madeira improvisados.
Para manter viva a memória e reverenciar quem veio antes, principalmente suas lutas, a Secretaria de Cultura e Economia Criativa de São Paulo abriu as portas do Museu das Favelas com a exposição FAVELA-RAIZ. A ocupação-manifesto, que representa o primeiro movimento de transformação do Palácio dos Campos Elíseos, reverencia a memória e as heranças das lutas dos que vieram antes e dos que seguem resistindo. É um símbolo de saudação às tradições, à ancestralidade, à maternidade, aos abrigos materiais e afetivos que envolvem os habitantes e a tudo o que ali foi semeado e colhido.
“O Museu das Favelas tem como premissa máxima o trabalho colaborativo com as pessoas que vivenciam o cotidiano das favelas e periferias”, diz Daniela Alfonsi, Diretora do Museu. “Processos como este, representam um diferencial na gestão de uma instituição museológica, que no caso do Museu, além desse processo colaborativo, propõe a articulação social e processos de geração de renda como pilares transversais importantes”.
Toda a ocupação é composta por cinco partes, sendo três internas e duas externas. No hall de entrada há esculturas tecidas em crochê, criadas pela artista Lidia Lisbôa com a colaboração de 7 mulheres do Coletivo Tem Sentimento e da Cooperativa Sin Fronteras, grupos de mulheres da vizinhança do Museu. A sala expositiva lateral traz uma instalação audiovisual sensorial, cuja curadoria selecionou imagens de 20 fotógrafos e produtores de conteúdos de diferentes periferias do Brasil.
A instalação, chamada “Visão Periférica”, revela aos visitantes a multiplicidade das experiências nas favelas, despertando memórias afetivas por meio do cruzamento de linguagens. No final do percurso interno da exposição, no salão de espelhos do palácio, tem uma instalação com criação sonora do rapper Kayode, exaltando os diferentes modos de se pensar a beleza. Já na parte de fora, está outro equipamento que sintetiza a história do Palácio dos Campos Elíseos, com pesquisa de História da Disputa e produzido com artes em serigrafia pelo Coletivo XiloCeasa.
Nos jardins, Paulo Nazareth – conhecido por suas andanças ao redor do mundo e seu trabalho que questiona os limites da performance como linguagem artística – traz uma das instalações de seu projeto “Corte Seco”, em homenagem à Maria Beatriz Nascimento, com escultura de alumínio, de 06 metros de altura, retratando essa que é uma mulher negra, historiadora, poeta, intelectual e ativista.
Por estar sediado no Palácio dos Campos Elíseos, o conceito do museu pode gerar uma certa controvérsia por não estar presente de fato em alguma favela de São Paulo, mas Carla Zulu, Coordenadora de Relações Institucionais do Museu, ressalta que “essa arquitetura, hoje, servirá para visibilizar aqueles que outrora foram postos pra fora daqui”.
“As exposições e instalações propostas mostram o quanto nós valorizamos os nossos artistas e teóricos. Então, a partir de sua abertura, o Museu das Favelas mostra sua marca institucional, que é dar voz e vez a quem está e sempre esteve construindo, mas que sempre foi invisibilizado”, observa ela.
O objetivo do Museu das Favela é ampliar o olhar para além de uma imagem cristalizada do que é a favela e buscar conexão direta com as experiências de quem vive nas periferias em sua dimensão individual e coletiva, partindo de um local de pluralidade e diversidade de narrativas que surgem com a proposta de ser o ponto de encontro, de passagem, de acolhimento e de potencialização das comunidades, de suas memórias e produções.
Foto capa: Instalação Visão Periférica | por Carlos Pires
SERVIÇO
Museu das Favelas
Palácio dos Campos Elíseos
Entrada pela Rua Guaianases, 1024 – São Paulo
De terça a domingo, das 9h às 17h (com permanência até as 18hs)
Entrada GRATUITA | ingressos poderão ser retirados de forma antecipada no site e, também, de maneira presencial.