Jota Carneiro não segue regras. Prefere quebrá-las. Com ilustrações eróticas e surrealistas, ela propõe discussões de comportamento para desmitificar a anatomia feminina e incentivar a busca pelo prazer. A escolha da temática surgiu de um desejo pessoal de expressão, que – de certa forma – pedia algo mais ousado para preencher uma lacuna artística.
“Entendi que existia uma necessidade latente de representação de uma sexualidade mais abrangente, múltipla, de prazeres e corpos”, diz. “Especialmente a partir de uma perspectiva feminina. Quando eu comecei a divulgar minhas ilustrações na rede, pude experimentar uma troca única que se tornou estudo e parte do meu processo criativo”.
O talento para desenhar, Jota sempre teve. Ser ilustradora também fazia parte dos seus sonhos. Mas se reconhecer como artista não aconteceu da noite para o dia. Demorou um pouco. Então, na intensão de ser professora (outra paixão cultivada por ela), cursou Licenciatura em Artes Plásticas na Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “Não acreditava que seria capaz de seguir a carreira, ao mesmo tempo em que não conseguia me ver longe da arte”. Os estudos e a vivência a ajudaram a se encontrar nas linhas e na aquarela, surgindo assim a pesquisa plástica do erotismo. “Foi um processo de experimentações… e conhecer outras referências femininas foi importantíssimo nessa jornada”.
Esse mergulho também foi pela influencia de outras mulheres que já abordavam o assunto na arte, como “Apollonia Saintclair, que trabalha bastante com o contraste do preto & branco, assim como as pinturas da Frida Castelli”. A lista de também inclui Layse Almada, Tainá Maneschy, Pri Barbosa, Alphachanneling e Milo Manara.
As referências também ajudaram Jota Carneiro a criar seu próprio estilo. Ao bater os olhos, é possível identificar seus traços. Na observação, pode-se dizer que retratar corpos femininos é uma das suas especialidades.
“O estudo com modelo vivo ajudou a soltar a linha, entender a anatomia e sintetizar o traço, contribuindo para o desenvolvimento da minha identidade artística”, observa. “Um dia escutei em algum lugar, uma conversa sobre símbolos e como eles são simples, mas passam uma forte mensagem. Isso ficou martelando na minha cabeça… Acho que foi quando comecei a abstrair certos detalhes nos meus desenhos, nas minhas personagens. E sigo aberta aos tantos caminhos e formas que a arte pode me levar”.
Para “dar vida à imaginação”, a artista visual nascida e criada no Rio de Janeiro tem processos criativos diferentes, que vai da leitura a referências visuais, passando por experiências pessoais e de terceiros, compartilhadas em diferentes formas. “Tudo me toca e tudo eu transformo”, afirma. “Sou bem metódica, gosto da rotina, de seguir horários… Organização me ajuda. Mas a criação é selvagem, por isso o peito está sempre aberto, por onde quer que eu vá, olhe e respire”.
Os métodos são essenciais para que Carneiro pense no objetivo funcional de cada peça. Pode não parecer, mas cada arte tem seu propósito. Um deles é a troca de informações e educação sexual positiva. Para ajudar no direcionamento, dados são coletados em atividades plásticas e ações virtuais socioeducativas. Apesar disso, o trabalho dela já sofreu censuras e inúmeros ataques nas redes sociais.
“No Instagram tive algumas imagens excluídas, inclusive observei um padrão a partir do uso de determinadas hashtags. Tanto que atualmente nem utilizo mais essa ferramenta. Já no Facebook, tive que bloquear cerca de 300 perfis além de denunciar mais de mil comentários de ódio, racismo, machismo e homofobia na minha página, depois que um desenho compartilhado em algum grupo viralizou. Mas em geral tenho respostas muito mais positivas do que negativas. Especialmente porque nas redes sociais eu tenho um crescimento bem orgânico de público. O ‘incômodo’ gerado só prova que preciso continuar expressando tudo isso”.
Seguir é o que Jota tem feito desde suas primeiras linhas. A constância tornou seu trabalho reconhecido e o levou para diferentes lugares. Em 2017, ela fez sua primeira exposição individual, “Corações Selvagens”, na Galeria La Cucaracha, no Rio de Janeiro, e a coletiva “Viva La Vulva”. No ano seguinte, participou da campanha “Todo Inverno Acaba”, para arrecada de fundos e doações ao CVV (Centro de Valorização da Vida) em prol do Setembro Amarelo, e realizou duas temporadas da exposição “Era Uma Vez O Tesão”. Em 2019 e 2020 participou de três exposições e duas mostras virtuais com um coletivo de artistas em parceria com a Ble Galeria (RJ), e ilustrou 8 peças para a coleção da DIVINÉ BOURBON [veja AQUI].
* Conheça o trabalho da Jota Carneiro neste link: linktr.ee/jotacarneiro.